sábado, outubro 30, 2010

Horas rubras


Horas profundas,lentas e caladas
Feitas de beijos sensuais e ardentes,
De noites de volúpia, noites quentes
Onde há risos de virgens desmaiadas…

Ouço as olaias rindo desgrenhadas…
Tombam astros em fogo, astros dementes.
E do luar os beijos languescentes
São pedaços de prata p’las estradas…

Os meus lábios são brancos como lagos…
Os meus braços são leves como afagos,
Vestiu-os o luar de sedas puras…

Sou chama e neve branca misteriosa…
E sou talvez, na noite voluptuosa,
Ó meu Poeta, o beijo que procuras!

Florbela Espanca

sexta-feira, outubro 29, 2010

Prêmio

Outro dia na sala de professores da ESAMC falávamos sobre quando começamos. O Antônio Carlos disse que havia começado a dar aulas com 23 anos. A Patrícia Magnino disse que começou a ensinar inglês bem cedo, algo como 21. O Roberto Chacur, um dos melhores fotógrafos de UDI, estava lá também e me ajudou a confirmar, dizendo que havia sido meu aluno de natação no UTC. Comecei com quinze.

Fuçando aqui no notebook, achei essa foto que nem sei de quando é, mas que é de um tempo muito bom, quando comecei aprender a compartilhar o meu conhecimento. Que acaba por sendo o que viemos fazer aqui.

Café com pão

Um dos primeiros contatos que eu tive com a poesia foi através desse poema. Ele fazia parte de algum livro adotado lá no Externato Rio Branco. Me lembro que tinha um desenho de um trem de ferro ao lado das letras. O ritmo das palavras, das sílabas me encantou. O "Café com pão, café com pão" era igualzinho ao barulho que eu ouvia quando embarcava na estação da Mogiana rumo a Ribeirão Preto. Uma criança tinha mesmo que ficar louca com estes sons repetidos em forma de palavras...

Trem de ferro

Café com pão
Café com pão
Café com pão

Virge Maria que foi isso maquinista?

Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
(trem de ferro, trem de ferro)

Oô...
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
Da ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!
Oô...
(café com pão é muito bom)

Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá
Oô...
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matar minha sede
Oô...
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no sertão
Sou de Ouricuri
Oô...

Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...
(trem de ferro, trem de ferro)

Manuel Bandeira

quarta-feira, outubro 27, 2010

Canção

Nem tive o trabalho de verificar se já havia postado este poema aqui. Li mais uma vez e mostro pra quem quiser se deliciar com as palavras deliciosas dessa deusa chamada Cecília. Palavras que as vezes parecem ser mais verdadeiras que a própria verdade dos dias e das noites e dos dias novamente.

Canção

Não te fies do tempo nem da eternidade,
que as nuvens me puxam pelos vestidos
que os ventos me arrastam contra o meu desejo!
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,

que amanhã morro e não te vejo!
Não demores tão longe, em lugar tão secreto,
nácar de silêncio que o mar comprime,
o lábio, limite do instante absoluto!

Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã eu morro e não te escuto!
Aparece-me agora, que ainda reconheço
a anêmona aberta na tua face

e em redor dos muros o vento inimigo…
Apressa-te, amor, que amanhã eu morro,
que amanhã eu morro e não te digo…


Cecília Meireles

domingo, outubro 24, 2010

Mudança

Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas. Dê os seus sapatos velhos. Procure andar descalço alguns dias. Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama... Depois, procure dormir em outras camas. Assista a outros programas de tv, compre outros jornais... leia outros livros.
Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias.
Tente o novo todo dia. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor.
A nova vida. Tente. Busque novos amigos. Tente novos amores. Faça novas relações.
Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, tome outro tipo de bebida, compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro mercado... outra marca de sabonete, outro creme dental... Tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores. Vá passear em outros lugares.
Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias.
Jogue os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco. Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus.
Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só. E pense seriamente em arrumar um outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso, mais digno, mais humano.
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo.
E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino. Experimente coisas novas. Troque novamente. Mude, de novo. Experimente outra vez.
Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda!
Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!

Clarice Lispector

sábado, outubro 23, 2010

quarta-feira, outubro 20, 2010

Leonard Cohen - Hallelujah

Essa música já esteve aqui em mais de uma oportunidade. Ela esteve aqui (mais aqui mesmo, aqui dentro...) mais de uma oportunidade. A mais surpreendente foi ouvi-la num lugar que não imaginava ouvi-la. E essa oportunidade me fez gostar dela ainda mais.



sábado, outubro 16, 2010

Blog do Júnior



Fica difícil pra mim falar do Júnior Degani aqui. Sou suspeito. O conheci quando eu tinha quinze meses e ele nada de meses. O meu e o pai dele foram irmãos inseparáveis e então, não falarei nada.

Mas agora o Júnior começou a publicar um blog. Venho falando pra ele fazer isso há tempos e agora ele resolveu. Poço de cultura que ele é, minha curiosidade aguçou-se pra ver os posts seguintes. Deem uma olhada aqui.

Abrigo

Que alma é essa que você traz consigo?
Que calma é essa que você faz comigo?
Em que era você tomou meu peito?
O que espera que eu faça do meu jeito?

Deu-me o tempo esse castigo?
Ou foi-me apenas um abrigo?
Pra que me guardasse
Pra que eu esperasse
Assim quieto o dia perfeito?

Tive de olhar os anos com olhos salgados
Perdi os profanos, perdi os sagrados
Pra que eu duvidasse
Pra que eu suplicasse
A volta do que não foi feito

Mas agora, esqueça o perigo
Destes tempos complicados
Olhe nos meus olhos alagados
Faça do meu peito o seu abrigo

sexta-feira, outubro 15, 2010

Saber viver

Não sei… Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura…
Enquanto durar

Cora Coralina

quarta-feira, outubro 13, 2010

terça-feira, outubro 12, 2010

23

O Senhor é o meu Pastor, nada me faltará.

Deitar-me faz em verdes pastos,
guia-me mansamente às águas tranquilas;

Refrigera a minha alma,
guia-me pelas veredas da justiça por amor do seu nome,

Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte
não temeria mal algum, porque tu estás comigo,
a tua vara e o teu cajado me consolam;

Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos,
unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda;

Certamente que a bondade e a misericórdia
me seguirão todos os dias de minha vida,
e habitarei na casa do Senhor por longos dias.

Amém.

segunda-feira, outubro 11, 2010

Luís, Paulo, Renato

Renato Russo já usou parte deste texto numa música linda chamada Monte Castelo, que já falei por aqui. Ele misturou Camões com São Paulo (Paulo de Tarso, o homenzinho que era soldado de Roma e se transformou num dos maiores propagadores do cristianismo). Renato Russo misturou tudo com seu talento e surgiu uma música linda (veja o link ali em cima).

Mas agora, segue a peça fundamental do portuguezinho que enxergava pouco, mas que sabia de muito. Quem ler os versos aí embaixo vai entender o que é ser poeta. Saber traduzir o que a Humanidade sente.


Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade
É servir a quem vence o vencedor,
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade;
Se tão contrário a si é o mesmo amor?

Luís de Camões

Ternura

Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor
seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos

Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentando
Pela graça indizível
dos teus passos eternamente fugindo

Trago a doçura
dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer
que o grande afeto que te deixo

Não traz o exaspero das lágrimas
nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras
dos véus da alma...

É um sossego, uma unção,
um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta

E deixes que as mãos cálidas da noite
encontrem sem fatalidade
o olhar estático da aurora.

Vinícius de Moraes

domingo, outubro 10, 2010

Festa na D. Luzia!

Nessa próxima semana tem o Dia das Crianças. A gente cresce, para de crescer (pelo menos na vertical...), cria cabelos brancos, deixa-os irem embora, mas é sempre a mesma coisa. Já ouvi uma mulher dizer que as mangas amadurecem, mas os homens não. Vai ver somos mesmo eternas crianças.

Então, deixo aqui uma foto de quando eu era de fato uma. O orelhudo com banca de James Bond sou eu, já grande demais para idade. O branquinho do outro lado é o Keller Garcia, irmão que é pela criação que tivemos e apenas vinte oito dias mais novo que eu (que isso fiquem bem claro, Keller...). No meio, o Carlinhos que não vejo há anos e é primo do Keller. Com o dedo na boca, meu primo e irmão Júnior Degani: Monstro Sagrado dos Assuntos Mais Interessantes, além de ser a alma mais companheira que já experimentei.

Éramos crianças. Não tínhamos alguns problemas que hoje atormentam alguns ali desta fotografia e outros que atormentam a todos. Mas espero chegar a um estágio de fazer com que aqueles problemas fiquem ultrapassados e quem sabe, fazer uma foto assim, parecida com essa e com os espíritos livres, como eles eram naquela época.

Vida longa às eternas crianças!



sábado, outubro 09, 2010

Em pedra

Pouco depois

Pouco antes

Against USA

In Madison Square Garden

In the bed

In USA

Ozzy sings John

Mother



Mother

Mother, you had me, but I never had you
I wanted you, you didn't want me
So I, I just got to tell you
Goodbye, goodbye
Father, you left me, but I never left you
I needed you, you didn't need me
So I, I just got to tell you
Goodbye, goodbye

Children, don't do what I have done
I couldn't walk and I tried to run
So I, I just got to tell you
Goodbye, goodbye

Mama don't go
Daddy come home

Mãe

Mãe, você me teve, mas eu nunca tive você.
Eu quis você, mas você não me quis
Então eu, eu comecei apenas a te dizer
Adeus, Adeus
Pai, você me deixou, mas eu nunca te deixei
Eu precisei de você, mas você não precisou de mim
Então eu, eu comecei apenas a te dizer
Adeus, adeus

Crianças não fazem o que eu tinha feito
Eu não pude andar e tentei correr
Então eu, eu tenho apenas que te dizer
Adeus, adeus

Mamãe, não vá
Papai, volte para casa

Love is real

Jealous Guy

Trilha sonora de filmes que vivemos.

Jonh Lennon by Aerosmith

Lennon em todo lugar de novo

Lennon em todo lugar

sexta-feira, outubro 08, 2010

Lennon com 70


Há trinta anos e dois meses eu entrava na casa do Júnior Degani, como sempre entrei, sem bater. E fui dizendo a ele: John Lennon foi assassinado! Na hora, ele achou que era mais uma das brincadeiras sem graça que a idade acabava por cometer. Mas não era.

Na noite anterior eu havia chegado ao meu quartinho que ficava de fora do corpo da minha casa, regresso de alguma noite de estudos. Tinha ligado o rádio e naquela época o que rolava era a Rádio Mundial. E não parava de tocar Starting Over, o single do vinil que Lennon havia lançado após anos de reclusão, criando o filho Sean. John tinha feito quarenta anos e havia retomado a alegria de viver. As músicas do álbum diziam isso.

Mas a música tocava insistentemente. Na hora, achei estranho. Por que tantas vezes? Algo me dizia que havia algo estranho. Em pouco tempo veio a notícia, que já se era velha e repetida. John Lennon tinha sido assassinado.

Se isso não tivesse acontecido, John faria setenta anos hoje. Quais músicas estaria compondo? Estaria ligado na internet? Beijaria Paul McCartney? O que ele diria do Oasis? Liam Gallagher daria qual nome ao filho dele?

Se John pudesse estar agora comemorando seus setenta anos com Yoko e Sean nós também estaríamos vivendo de maneira diferente. Pelo menos, eu e Júnior Degani.





70


Todo mundo junto.

quinta-feira, outubro 07, 2010

E se eu disser

E se eu disser que te amo – assim, de cara,
sem mais delonga ou tímidos rodeios,
sem nem saber se a confissão te enfara
ou se te apraz o emprego de tais meios?

E se eu disser que sonho com teus seios,
teu ventre, tuas coxas, tua clara
maneira de sorrir, os lábios cheios
da luz que escorre de uma estrela rara?

E se eu disser que à noite não consigo
sequer adormecer porque me agarro
à imagem que de ti em vão persigo?

Pois eis que o digo, amor. E logo esbarro
em tua ausência – essa lâmina exata
que me penetra e fere e sangra e mata.

Ivan Junqueira

quarta-feira, outubro 06, 2010

Japan is soft

Há anos, numa mesa cheia de papos sobre culturas, alguém disse que o Japão tinha apenas “hardware” e nada de “software”. As duas palavras, com aspas, para significar que aquele país produzia bem filmadoras, aparelhos de som, instrumentos musicais, mas não tinha expoentes em atores, diretores, músicos e por aí afora.

Usei meus tempos de cinema de arte no Cine Windsor (hoje, Vitorio’s) pra citar Akira Kurozawa, Toshiro Mifune, Ken Watanabe (mais conhecido atualmente, por ter feito O Último Samurai, com Tom Cruise). Disse também algo sobre autores (chutei muito, claro, não entendo nada de literatura japonesa... Mas nessas horas, com muita cerveja, vale qualquer coisa...).

Mas falei com propriedade de um músico/ator que sempre mereceu destaque e quase ninguém conhece. Já postei coisas dele aqui e posto de novo. Ryuichi Sakamoto é um cara fora do padrão e neste vídeo (junto com o brasileiro Jacques Morelembaum) interpreta essa maravilha de trilha sonora do filme O Último Imperador, do Bernardo Bertolucci. Aqui, além da trilha ele ainda atua. Quem nunca viu, tem que baixar pra ver.

Japão é muito mais que hardware.




terça-feira, outubro 05, 2010

domingo, outubro 03, 2010

Fanatismo

Minh’alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver!
Não és sequer a razão do meu viver,
Pois que tu és já toda a minha vida!

Não vejo nada assim enlouquecida...
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida!

"Tudo no mundo é frágil, tudo passa..."
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim!

E, olhos postos em ti, digo de rastros:
"Ah! Podem voar mundos, morrer astros,
Que tu és como Deus: Princípio e Fim!..."

Florbela Espanca

sábado, outubro 02, 2010

Amor

Quero um amor alucinado, depravado, tarado.
Amor inteiro, de corpo-a-corpo, enlaçados.
Amor sem reserva, que a tudo se entrega, lancinante.

Quero você assim, abrasada, pedindo gozo,
Eriçada, ronronando feito gata, tesuda.
Seus seios túmidos, me furando o peito.

Quero você, pentelho contra pentelho, roçantes.
Carne encravada na carne. Bocas coladas,
Babadas, meladas, sangrando sufocadas.

Quero amar você tão bichalmente que urremos.
Eu, penetrando rasgando. Você me comendo furiosa.
Nós dois fundidos, unidos, soldados.

Você e eu, nós dois, sós, neste mundo dos outros.

Darcy Ribeiro

Francis Bacon - 3

Sem título

Vish!
Será que consigo
Devorar Nietzsche?
É bom que eu capriche
Se não há xixe
And i don’t wish.

sexta-feira, outubro 01, 2010

Leonardo da Vinci

Mim

O tempo transcorre em mim
Celeremente.
Tão afoito que finda.

Acho que sei, afinal, a que vim.
E já me vou.
Uma pena.

Não há tempo mais pra mim.
Volto à silente matéria cósmica
Que em mim, um dia, se organizou
Para me ser.
Uma vez, uma vez somente.

Darcy Ribeiro

Francis Bacon - 2

Belo Belo

Belo belo minha bela
Tenho tudo que não quero
Não tenho nada que quero
Não quero óculos nem tosse
Nem obrigação de voto
Quero quero
Quero a solidão dos píncaros
A água da fonte escondida
A rosa que floresceu
Sobre a escarpa inacessível
A luz da primeira estrela
Piscando no lusco-fusco
Quero quero
Quero dar a volta ao mundo
Só num navio de vela
Quero rever Pernambuco
Quero ver Bagdá e Cusco
Quero quero
Quero o moreno de Estela
Quero a brancura de Elisa
Quero a saliva de Bela
Quero as sardas de Adalgisa
Quero quero tanta coisa
Belo belo
Mas basta de lero-lero
Vida noves fora zero.

Manuel Bandeira